quarta-feira, 18 de novembro de 2009


Toda a gente sabe, a esta altura, que passei por algo mau. O nome que lhe dão é depressão. Ultimamente, a comunicação social tem falado nisso a propósito da morte do ex-guarda-redes do Benfica, Robert Enke. Mas por muito que se descrevam os sintomas, as sensações e os perigos, isso não basta para se perceber a dimensão que tem uma depressão. Eu, por minha parte, não me vou alargar a descrevê-la também.


Hoje, quero sublinhar que, durante este período negro, o que de me salvou foram os momentos positivos, no meio de toda a escuridão que me envolvia. Esses momentos foram-me proporcionados por muitas pessoas, mas não de forma consistente. O Ricardo, pela força daquilo que me fazia sentir, era como tomar 100 anti-depressivos duma vez só. Enquanto estava com ele, ainda que estivesse a dormir, estava tudo bem. A vida fazia sentido e tinha propósitos.


Fora disso, acho que apenas tu soubeste o que eu passei. Apenas tu me deste motivos para sorrir consistentemente. Todos os dias ouviste o que eu tinha para dizer, fosse a que horas fosse, mesmo que fosse a enésima repetição de tudo o que já tinhas ouvido antes. Não te cansaste um único dia de todos os dramas e histórias podres que tinha para contar. Não te cansaste de me apertar o braço com força e de me segurar com quantas forças tinhas. Não te cansaste mesmo quando eu era apenas um ninho de mofo e pó, a apodrecer quieta na minha própria porcaria. Muitos dias, era apenas isso que eu era.


Lembro-me das noites (altas horas), em que te liguei apenas para não chorar sozinha. E não fazia absolutamente mais nada a não ser chorar. E tu apenas ouvias pacientemente. Sei que morrias de medo que, no meio de todo o desespero em que estava enterrada, eu te largasse a mão e me fosse. E havia dias em que quase, quase foi o que aconteceu. E, ainda que tivesse acontecido, podes ter a certeza mais absoluta que não teria sido por tua falta. Estiveste lá, como mais ninguém.


Sei que estavam todos preocupados comigo, nessas alturas. A maioria interrogava-se mais pelos porquês do que se esforçava por me pegar na mão. Muitos tentavam agarrá-la e era eu quem não queria. Porque, por difícil que seja admití-lo, ninguém poderia entender-me nessa altura. Nem tu próprio me entendias a maior parte do tempo. Mas sabia que contigo não havia julgamentos. Sabia que de ti apenas haveria compreensão, atenção, esforço, carinho. Acima de tudo, soube sempre que de ti apenas teria dedicação. Afinal, é assim que se ama realmente. E, apenas tu, até hoje me provaste que isso não é apenas uma utopia.


Era preciso saber, como tu soubeste, para que eu não fugisse, como fugi de todos menos de ti. E, por isso, te deverei sempre a minha vida. Não consigo imaginar como teria sido, se tu não estivesses lá comigo, para mim, completamente esquecido de ti, das tuas defesas, daquelas que eram as tuas necessidades. Abandonaste-te a ti para me valeres a mim. O buraco onde te afundaste, foi cavado por mim. Foi o mesmo que o meu.


Por isso te disse que desculpas não bastam, nem para começar a remendar o estrago. Aliás, se pensar um pouco nisso, sei que se mexer posso estragar ainda mais. Basta que seja tocado por mim. Ainda assim, sei que nunca me perdoaria, se nada fizesse. Não seria eu, bem sabes. Sabes melhor do que ninguém. Como já te disse, viste por dentro e por fora, em baixo e no alto, tudo o que há de mim para ver. Se agora te pareço uma estranha, sabes que na realidade, ninguém me conhece melhor do que tu.

Agradecer-te, ainda que usasse todas as palavras bonitas que conheço, também não chegaria para que, nem tu nem ninguém, entedesse o quanto te tenho a agradecer. Todos os momentos que vivo desde o momento em que me agarraste são da tua responsabilidade. Ter vivido bem ou mal, ter errado ou acertado, ter sorrido ou chorado, ter-me entregue ou recebido, aconteceu tudo porque tu não desististe de mim, da minha vida.

Quando chegou a hora de tu precisares de mim, eu já estava demasiado longe de tudo isso. Tu jazias no buraco cavado por mim, olhando-me sem nada me exigires. Como de todas as vezes, escolher a saída mais fácil foi um erro. Deixei-te ali, porque olhar para ti, ver-te, ouvir-te era como voltar a descer e entrar de novo nessa treva. A minha cobardia não deixou que a minha força se mostrasse. O meu medo levou a melhor e quem sofreu foste tu. E se alguém havia que não o merecia eras tu.

Espero que os caminhos, o teu e o meu, não se afastem por muito tempo. Espero que se continuem a cruzar. Já errei contigo, já erraste comigo. Mas sei que o contrário é muito maior em quantidade e qualidade e espero que seja suficiente para sarar as feridas que ficaram. Isto não chega, nem de longe, para ajudar a aproximar-nos, a podermos sorrir juntos. Espero que seja um começo, um novo, um melhor. Não há na Língua Portuguesa um nome que abarque aquilo que nos une, aquilo que somos. Se isso não é motivo suficiente para tentar, não sei o que é. Mas isso sou eu...

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